03 dezembro 2009

Ra: Leilões para quem os tem no sítio

Há certas coisas que nos aquecem o coração. Estava eu a navegar pelo site todo catita do tujogas.pt quando me deparo com este parágrafo sobre este cantinho:

“Este blog foi um dos primeiros sites, senão o primeiro, a escrever conteúdos sobre jogos de tabuleiro em Portugal. Mantido por dois jogadores da zona de Lisboa, oferece reviews, sessões de jogo e artigos de opinião sempre com um toque humorístico muito particular e característico, que nos faz rir e sorrir vezes sem conta. Apesar de actualmente não ter a mesma actividade regular de outrora, é, e será sempre um marco de referência no panorama nacional.”

Após a leitura de tão simpáticas palavras só me restou, enquanto visado, abrir o Word e escrever qualquer coisa de forma a poder merecer o palavreado.
Com a chegada do Gabriel, agora com 9 meses, o tempo para conhecer as novidades no mercado é escasso. Por isso, só tenho acesso a jogos antigos o que me torna inútil para os jogadores ávidos por saber o que de novo anda no mercado. A todos eles apenas digo que não há nada como os clássicos.
Paradoxalmente, e apesar de todo o tempo que uma cria consome a um homem, 2009 foi o ano em que joguei mais, isto devido a ter um grupo certo de jogadores, constituído por colegas de trabalho que aproveita a hora de almoço para uma jogatina. Portanto, devido a essa feliz contingência da vida, sou um grande consumidor de Snow Tails, Powerboats, Bohnanza e Ra.
Este último jogo, de Reiner Knizia, é mesmo um dos preferidos, tornando-se bastante jogado e comentado na hora de expediente.



Não é fácil explicar como tudo se processa. Existe um saco negro onde se acotovelam 1600 tiles de vários tipos. As combinações destas tiles determinam a pontuação do jogador.
Exemplo, o jogador que tiver mais tiles verdes no final de cada ronda ganha 5 pontos. O jogador que tiver menos perde 3 pontos. Por outro lado, o jogador que não conseguir uma tile cinzenta por ronda perde 5 pontos. Como podem ver, o sistema de pontuação não é muito simples e o jogo está cheio de exemplos destes. Cada tipo de tile tem o seu sistema próprio de pontuação. Isso faz com que algumas tiles sejam de extrema importância e que exijam um esforço do jogador para as conseguir, de forma a poder maximizar a sua pontuação.
A forma de conseguir os pedaços de cartão tão badalados no parágrafo anterior é através dum leilão algo sui generis. Aqui, mais uma vez, as coisas voltam a complicar-se. Cada jogador no início de cada turno dispõe de 3 fichas. Estas fichas têm valores diferentes para cada jogador, mas são sequenciais. Ou seja, vão de 1 a 13 ou 16 consoante o numero de convivas. As coisas começam equilibradas. O jogador que tiver a peça com o número mais alto é também o que tem o número mais baixo.
As tiles vão saindo do saco e a determinada altura (não interessa entrar aqui em pormenores) vai-se fazer o leilão. Nesta fase os jogadores pegam nas suas peças numeradas e leiloam. O twist final, ou não fosse este um jogo do Mestre Knizia, é que a peça que o jogador usou para ganhar o leilão vai para o meio e será leiloada juntamente com as tiles que saírem na próxima arrematação. Exemplo: Imagine o adorado e inteligente leitor que vão ser leiloadas 3 tiles verdes, 2 azuis e uma cinzenta. No meio da mesa está uma peça com o numero “4”. Ciente da importância desta mão, o jogador decide num acto de sensatez, jogar a sua peça “15”. Ganha o leilão e todas as tiles mais o número 4 que pode ser usado para leilões posteriores. O seu nº 15 vai para o meio. No próximo leilão o jogador que o ganhar, vai ficar com as tiles que saírem do saco mais o numero 15.
Basicamente é isto. Convém ainda salientar que existem tiles negativas que fazem um jogador perder pontos. Por outro lado existem os “RA” que são tiles que aceleram o fim do jogo e forçam um leilão. Seja como for, existe também a possibilidade de qualquer jogador poder forçar um leilão, ficando apenas obrigado a licitar.


Tudo isto parece complicado e de facto é. Mas após meia dúzia de jogadas já se percebe tudo e não existem dúvidas.
O que é interessante no meio disto tudo é que o jogador vê-se obrigado a tomar muitas decisões. Valerá a pena licitar ou esperar por melhores oportunidades? Esta dúvida acompanha o jogador por 45 minutos e é preciso ter algum sangue frio para não perder a cabeça e começar a fazer merda. Até porque, as contingências do jogo podem originar que um jogador fique sozinho a jogar. Repare que uma vez usadas as peças que o jogador dispõe em cada ronda, este ficará de fora, não podendo participar em mais nada até que todos tenham usado as suas peças de leilão. Portanto quem se guardar para o fim poderá tirar tiles à vontade do saco sabendo que irá ficar com elas. No entanto o saco é padrasto e nem sempre jogar sozinho equivale a uma grande jogada.


Ra é isto. Claro que depois desta explicação não percebeu patavina do jogo. O que posso garantir é que é um jogo rápido e onde é necessário decidir. Originará muitas dúvidas na sua cabeça e ficará a rodar as peças de leilão pelos dedos enquanto decide o que fazer.
De certa forma até se pode equiparar a um banal jogo de Poker, pelo menos no que toca a sangue frio. Embora Ra não disponha da artimanha do Bluff, tem outras vantagens bem mais interessantes na minha opinião, como por exemplo a profundidade.
Ra é um jogo brilhante que dá gozo jogar e faz parte dos grandes clássicos do tabuleiro. Infelizmente nem toda a gente consegue partilhar esta paixão por esta obra de Reiner Knizia, mas os que gostam não o param de jogar.

Classificação: ****