08 janeiro 2006

Crítica/Session Report: Struggle of Empires

Teve lugar, no MagicMeck de Cascais, mais um monumental encontro do pessoal apreciador e adepto de jogos de tabuleiro. Ao contrário do que se esperava, a matinée não foi passada a tentar resolver os sempre insondáveis problemas do universo (BattleStations), mas antes os problemas do mundo durante o século 19, início do 20. O jogo escolhido foi o Struggle of Empires do sempre oportuno Martin Wallace que deleitou a malta que teve a amabilidade e, julgo, o prazer de aparecer.
Pois durante as 4 horas em que nos juntámos à mesa, todos nós nos sentimos imperadores e de tudo fizemos para levar a bom porto os interesses do império que representámos. Assim a representar a Inglaterra estive eu, a França a Raquel, a Espanha o Shaim, o António a Áustria, o Rodrigo a Rússia e o Ricardo a Prussia.
Passado o sempre doloroso e aborrecido período de aprendizagem das regras, que até correu bem, muito embora as instruções suscitem muitas dúvidas que se foram, felizmente, resolvendo aos poucos, iniciámos então as negociações para as alianças, através dum leilão. A fase das alianças é a fase em que se define os jogadores que ficam dum lado e os que ficam do outro da barricada e também a ordem de jogo. É uma parte muito importante que, durante uma partida, tem lugar 3 vezes. O jogo divide-se em 3 guerras de 5 rondas cada uma. Em cada ronda um jogador pode realizar duas acções. Somam-se os pontos ao fim de cada guerra. Ao fim da 3ª guerra quem tiver mais pontos ganha.
Sempre que o leilão das alianças termina, todo o sentido político do jogo se altera. A realidade geopolítica altera-se completamente dum momento para o outro. Antigos parceiros podem-se transformar em inimigos mortais, destruindo-se assim uma parceria diplomática de interesse comum. Eu e o António, por exemplo, passámos dois terços do jogo em amena amizade, dividindo entre nós a influência nas Caraíbas e na Índia quando, subitamente, o Ricardo, esse mestre obscuro da caos e da morte, transformou-nos por 15 ouros (uma autêntica fortuna) em inimigos sem escrúpulos. Como consequência a Índia transformou-se num cemitério onde os cadáveres enchiam as ruas. A carnificina foi tanta, que até as paredes do Taj Mahal foram pintadas de sangue.
Quero com isto provar que o Struggle of Empires é um jogo imprevisível, nunca se sabe muito bem como vai na guerra seguinte. O melhor é nunca fiar. Normalmente, alianças muito longas não interessam à maioria dos jogadores e mantê-las envolve, quase sempre, um grande esforço económico. E dinheiro meus amigos, é material que não abunda, a não ser que se tenha companhias comerciais que vão minimizando o problema. Manter um exército em condições é demasiado dispendioso e fazer uma guerra não é nada barato. Além de que, o endividamento e as baixas de guerra geram pontos de descontentamento que provocam alguma agitação civil o que, em última instância, pode provocar a derrota. Seja como for, o jogador que tiver ao fim da partida mais pontos de descontentamento perde 7 pontos de vitória e o segundo 5. É muito ponto. E quem somar 20 pontos de descontentamento perde o jogo.
Ao invés, existem muitos pontos de vitoria em disputa e uma hegemonia duradoura duma certa aliança pode tornar impossível a obtenção de pontos numa determinada área aos jogadores que não façam parte dessa mesma aliança. Ou seja, é possível dois aliados ganhar o máximo de pontos sem combater, isto é sem sofrer baixas e sem com isso provocar a agitação social responsável por pontos de descontentamento. Foi o que estava a acontecer comigo e com o o António. Nas Caraíbas e nas Índias ninguém lá entrava. Eu e ele dividíamos os pontos da região e mantínhamos um paz que, apesar de tudo, era bastante armada. O valor da manutenção do exército que dispúnhamos nessas colónias era uma enormidade. É verdade que estávamos em paz, mas havia sempre o risco de ficarmos em alianças diferentes e o conflito estalar. Por isso, cientes das palavras do grande Maquiavel “fazer a paz com os olhos postos na guerra”, começámos a enviar tropas para as Índias e Caraíbas, gastando fortunas e concentrando as nossas forças em dois sítios quando deveríamos, antes, ter apostado alguma coisa na Europa, onde os pontos em disputa são maiores.
Quando estalou a guerra entre mim e ele, perdemos qualquer hipótese de lutar por uma boa classificação. Um dos grandes desafios do jogo é só ser permitido fazer duas acções por ronda, o que é muito pouco para os sonhos que se tem. Existem milhões de “tiles” que permitem acções extra, mas mesmo assim é muito pouco para resolver todos os problemas com que um jogador se vai debatendo. Para tapar um buraco destapa-se outro.
Quem melhor se safou foi quem investiu na Europa, nomeadamente a Raquel e o Shaim. A Raquel até fez lembrar os tempo de Napoleão e a sua demanda pela expansão da ordem liberal, sendo nesse sentido uma justa vencedora. Conquistou uma grande influência na Europa e melhor do que isso, soube defendê-la. Shaim também teve o mesmo princípio de se imiscuir nos assuntos Europeus arrebatando para si a Península Itálica, muito embora não abdicasse da posse de Timor, essa terra esquecida que o Sr do caos e da destruição, essa semente do mal (leia-se Ricardo) fez o favor de lembrar que também entrava nas contas do jogo.
Por outro lado o Rodrigo foi dividindo as suas forças pelo mapa, ganhando a América do Sul e apanhando o que havia para apanhar na América do Norte com movimentações rápidas e mortíferas. Também teve a sua presença em alguns territórios Europeus.
O Ricardo, nunca conseguiu estabelecer-se em nenhum lado, resultado de alianças mal preservadas e também, algum azar nos dados.
Eu também tinha a minha influência em África e consegui sem problemas controlar o mercado de escravatura para as Américas que ainda me valeu alguns pontos e alguns ouros. Mas a manutenção do meu exército era muito dispendiosa, e o meu poder militar não se reflectiu na obtenção de pontos, porque simplesmente os meus exércitos estavam parados nas colónias a defender uma paz que podia acabar dum momento para o outro. O António teve o mesmo problema. A nossa paz foi muito mal gerida. Perdemos o jogo quando devíamos ter lutado pela vitória. Ai se fosse agora...
Registo ainda para a pior jogada logística da história do jogos de tabuleiro, quando o António tentou desembarcar em Timor para defender os timorenses da Tirania do Imperador Espanhol (Shaim). A ideia era boa, mas um Tsunami na região engoliu os seus barcos e os seus exércitos matando e arrasando a ideia de tomar Timor pelo Imperador Austríaco. Nunca vi tanto azar junto.



Uma nota para as batalhas. O vencedor apura-se através da diferença dos dois lados lançados, somando-se a este valor o número de exércitos estacionados na zona. O jogador pode ou não ter ajuda dos seus parceiros de aliança, dependendo da boa vontade destes e dos interesses envolvidos. É permitido um jogador pagar por ajuda ou para um determinado jogador não ajudar outro. As vitórias em batalhas dão marcadores de influência e quantos mais marcadores de influência um jogador tiver mais pontos ganha.
O jogo, infelizmente não chegou a acabar. Este enredo épico durou umas quatro horas e os donos da loja tinham a família à espera. Não faltou muito e a Raquel foi dada como vencedora, mas seria interessante saber o jogador que mais pontos de descontentamento amealhou.
Arrumado o material, toda a gente ficou contente e prometeu-se logo ali uma desforra para quando Deus quiser. Por enquanto é hora de pensar no jogo e tentar perceber o melhor caminho a percorrer para quando voltarmos a jogar a esta obra prima de Martin Wallace. Mas para a próxima que venha lá o pessoal do IST para verem o que é bom para a tosse.
Resto das fotos: aqui



Pontos Positivos:
- Muita interacção entre os jogadores.
- Muitas decisões para serem tomadas e pouco espaço de manobra para erros.
- Muito envolvente, dá mesmo a ideia de estarmos no século XIX.
- Reviravoltas súbitas.
- Dos melhores, ou talvez o melhor, jogo de estratégia militar no mercado.

Pontos Negativos:
- Só tem algum interesse quando jogado a pelo menos 5 jogadores.
- Livro de regras a dar para o fraco. Necessária a consulta de material de apoio no Boardgamegeek
- Demasiado bélico que pode ser desinteressante a alguns gamers, que prefiram algo mais light.
- Muitos tiles em cima da mesa e do tabuleiro.

03 janeiro 2006

Crítica: Blue Moon

Ora nem de propósito. Estava eu pronto para assistir à aula das oito da manhã, quando de repente me dou conta duma avaria no metro que me deixa apeado no Rossio sem grandes soluções para poder chegar à faculdade a tempo e horas.
Assim sendo, restou-me apenas ir para o trabalho, uma hora e meia antes da hora de entrada o que levou algumas das empregadas de limpeza, pouco habituadas a tamanho afinco, a murmurar:
“Mas que raio...”
Mas em boa hora isso aconteceu. Fiquei dum momento para o outro com 90 minutos extra para conhecer as maravilhas do “emule” e escrever alguma coisa sobre um jogo que veio no sapatinho este Natal e pelo qual morri de amores: Blue Moon.
Mas antes de entrarmos na maravilha de Reiner Knizia, deixo apenas uma nota prévia. Durante alguns meses da minha vida, felizmente poucos, andei apanhado pelo Magic the Gathering. Todas as semanas, sem falta, lá ia eu e o Paulo jogá-lo. Fazíamos o baralho com as cartas que íamos comprando e tentávamos a nossa sorte.
Nesses idos dias em que raramente ganhava, os adversários tinham sempre uma carta qualquer que me baralhava o sistema e que não permitia que respondesse em devidas condições. Quase sempre as minhas derrotas eram lentas, agonizantes e humilhantes. Por muito que tentasse faltavam-me as cartas, aquelas que eram raras e que só alguns é que as tinham.
Um dia, porém, farto de me encontrar numa situação de inferioridade, decido investir à bruta. Cheguei ao balcão lá da loja e disse:
“Quero, se faz favor, esta carta.”
Paguei 12 euros pelo raio da carta, mas pelo menos sabia que com ela poderia dar alguma luta. A minha namorada da altura, pouco ciente das vantagens do negócio, é que não gostou nada do impulso:
“O quê? Doze Euros por uma carta? Olha Hugo, eu faço anos daqui a um mês e uma coisa te garanto, valho pelo menos dez vezes mais que um pedaço de cartão a dizer destrói todos os encantamentos.”
Não sei se era o vendedor que tinha má vontade ou se era defeito de fabrico, mas o estupor da carta vinha enganada ou enguiçada porque o que deveria dizer era "destrói todos os namoros", porque, a verdade, é que não só fiquei sem a namorada como ainda por cima continuei sem ganhar nenhum jogo. Pelo que me apercebi posteriormente, precisava de mais duas ou três cartitas do mesmo teor e claro, do mesmo preço. Desisti do Magic e comecei a jogar sueca com a malta do café que, para além de conseguir ganhar a maior parte dos jogos, ainda recebia dúzias de minis por isso.


Comprei recentemente o Blue Moon na esperança de voltar a sentir o ambiente do Magic. O facto de ser pensado pelo grande Reiner Knizia deixava-me deveras esperançado.
Felizmente, logo após ter jogado os dois primeiros jogos senti que as minhas expectativas mais optimistas tinham sido largamente ultrapassadas.
Não sei se é do que o homem junta aos cereais da manhã, mas a verdade é que, para a sua tão prolifera actividade profissional, raramente este alemão tem percalços que o envergonhem.
O jogo é, como seria de esperar, bastante simples. No set inicial vêm duas raças de 30 cartas cada e o tabuleiro do jogo que, tal como o tabuleiro do Lost Cities, não é preciso para absolutamente nada.
Cada raça pode ter 4 tipos de cartas. Os leaderships que têm uma capacidade especial, as criaturas que podem, ou não, ter texto que permita ao jogador obter alguma vantagem, os boosters que aumentam o valor das cartas de criatura e as cartas de suporte que permitem não só aumentar o poder de ataque do jogador como também usufruir de capacidades especiais.
As regras são bastante simples, mas resumem-se a batalhas entre os jogadores em que o desfecho destas dependem do poder de fogo/terra que as cartas que vão sendo jogadas para a mesa possuem. Sempre que um jogador atinge um valor de ataque que o adversário não pode igualar a batalha termina e inicia-se outra retirando-se as cartas que estão na mesa. Contudo quanto mais cartas forem jogadas durante uma batalha mais valiosa é a mesma.
Depois é o costume. Cartas que podem voltar para a mão, cartas que duplicam os valores em jogo, cartas que servem como escudos, cartas que permitem sacar do deck mais cartas, cartas que diminuem a mão do adversário, cartas disto e cartas daquilo. A panóplia é imensa e depende um pouco das características de raça com que se joga.
Ao todo são oito as raças existentes, mais duas – inquisidores e inquisidores que têm características distintas. Cada raça tem 30 cartas que são ilustradas por ilustradores diferentes, conferindo assim um aspecto único, até porque cada baralho à venda tem a sua especificidade.


O que realmente atrai em Blue Moon é o facto de qualquer jogador poder comprar uma expansão (raça) e ter acesso às cartas todas dessa expansão. Além disso não existe um mercado negro onde os singelos e bonitos pedaços de cartão atingem preços ridículos. Aqui todos têm as mesmas possibilidades. A vitória consegue-se pelo engenho e não pela conta bancária. Isso permite que cada interveniente possa ter tantas possibilidades de êxito que o seu rival. Além disso é um jogo de parada e resposta, pelo que, ao contrário do Magic, é relativamente fácil um jogador responder aos ataques do outro sem ficar tramado na segunda carta que o adversário põe na mesa, isto porque as raças são, mais ou menos equilibradas e portanto a constituição dos decks são muito similares.
Nas regras mais avançadas, um jogador pode trocar três ou quatro cartas da sua raça por cartas de outra raça, dependendo do valor das cartas que queira trocar.
Apesar do sistema de jogo ser bastante simples, é preciso puxar um bocado pela cabeça. Existem cartas mais valiosas que outras e dum modo ou de outro é preciso saber até que ponto é mais proveitoso perder uma batalha mas continuar com uma determinada carta ou o contrário.
Por estas razões e por mais algumas, Blue Moon é o jogo perfeito para quem gosta de Magic e se fartou do negócio da coisa. Blue Moon é viciante e sinceramente, gosto bastante mais dele que do jogo da Wizards. Mas gostos não se discutem.



Pontos Positivos
- Permite recriar o ambiente do Magic sem ser necessário gastar milhares de Euros.
- O resultado duma partida é fruto do raciocínio e de alguma sorte e não da capacidade financeira do jogador/pai do jogador.
- Não existem cartas raras o que possibilita partidas sempre equilibradas.
- Ilustrações magníficas.
- Facilidade de aprendizagem.
- É muito difícil alguém não gostar do jogo. A sua simplicidade faz lembrar os jogos de cartas que jogava na infância como o Burro ou a Batalha, só que claro com o factor sorte bastante diminuído.

Pontos Negativos
- Apesar de tudo, são 10 as expansões existentes o que, feitas as contas, não é uma brincadeira que saía muito barata.
- Como demonstrado na imagem, existem certos atributos que, comparado com o Magic, o Blue Moon não consegue igualar.